Quando os filhos perdem os pais o chamam de órfão. Quando um cônjuge perde seu companheiro o chamam de viúvo ou viúva. E quando marido e mulher, pais, perdem um filho? A isso não se dá nome, se tivesse, certamente seria DOR. Ouvi isso não me lembro onde e me marcou tão profundamente que jamais me esqueci. Ensaio esse texto mas começo a escrever, não me contenho e me derramo em lágrimas. De fato, perder um filho, ainda que seja um bebê, é dor sem tamanho. Mas creio que quando externalizamos, elaboramos melhor e findamos o luto.

Vivemos a alegria da descoberta de uma gravidez. Gestação planejada, corpo e mente sãos, ácido fólico em dia mas após dois meses, o sonho começou a ser frustrado pela notícia de que se tratava de uma gravidez de risco.

Ao sinal de positivo desde o primeiro exame, aquele de farmácia, já me sentia grávida. Diariamente as transformações no corpo, seios doloridos, emoções à flor da pele e uma alegria indescritível. Depois do exame de sangue positivo, fiz o anúncio ao meu marido em uma caixa de presente. Coloquei o exame, uma foto nossa em família e um macacãozinho do Cruzeiro, nosso time do coração. Vibramos, comemoramos e decidimos não guardar segredo. Afinal, o melhor das boas notícias é compartilhar com aqueles que amamos.

Agendamos uma consulta e finalmente ouvimos o coraçãozinho do bebê. Ao ouvir o coraçãozinho dele tivemos convicção de que eram como música para os ouvidos. Radiante, me encantava com as vitrines de roupinhas, móveis e acessórios de bebê, pensamos na melhor disposição para o quarto, fizemos listas de possíveis nomes e a cada dia, a empolgação tomava conta de nós.

Nossos pais e amigos mais próximos ficaram imensamente felizes conosco. A notícia da chegada de uma nova vida traz vigor, aproxima a família, promove muitos planos e sonhos. Nossos três filhos surpreendentemente estavam empolgados com a ideia de um irmãozinho ou irmãnzinha temporão. Apesar do ciúme natural e já esperado entre irmãos, vibravam a cada novidade.

Depois de um inesperado sangramento, corremos para o hospital e realizamos novos exames. O saquinho gestacional estava a salvo. Agendamos uma consulta para os dias seguintes. Diante da ameaça de descolamento, repouso absoluto, muitos remédios para segurar o neném, pés para o alto e mente à mil, mesmo recebendo todo cuidado do meu amor, ficava apreensiva a cada xixi.

As cólicas e a preocupação intensificaram. Chegando à clínica, depois de minutos infindáveis de espera, fui para a temida e ao mesmo tempo aguardada sala de exames. Lá, ao não ouvirmos o coração do neném na ultrasonografia, fui enfim informada do aborto espontâneo. Assim, um sangramento pós fim ao projeto bebê a bordo, numa manhã nublada.

O plano interrompido deu lugar a várias etapas do luto. Primeiro, a negação, eu não conseguia acreditar que estava passando por essa perda. A seguir veio a raiva, momento em que tentava encontrar culpados para o ocorrido. Depois a negociação, em que tentava barganhar com Deus que faria qualquer coisa para não sentir aquela dor horrenda. Logo em seguida, a depressão me assolava, uma tristeza tão profunda que me faltava vontade e forças para reagir. Por fim, a aceitação, período em que me voltei completamente para a palavra de Deus e encontrei o conforto e apoio devidos. Me firmava na ideia de que todas as coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus e são chamados segundo o seu propósito (Romanos 8.28).

Ainda não me sinto completamente à vontade para tratar esse assunto, dói mas não espero dramatizar ainda mais o ocorrido, meu desejo é apenas consolar quem passa ou já passou por situação semelhante. Me perguntava insistentemente como podemos amar tanto alguém que ainda nem conhecemos. A resposta também está em Deus, Ele mesmo nos amou quando ainda éramos substancia informe (Salmos 119.16).

Infelizmente meu bebê morreu e meu consolo é crer que ele está junto com Jesus e um dia na eternidade, vamos nos reencontrar e entender tudo isso. Com o tempo esse sentimento de vazio e incompreensão vai sendo substituído pela paz que excede todo entendimento (Filipenses 4.7).

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